30.7.13

Chegaram a ser vizinhos,

mas o Blogger chegou primeiro ao bairro. Tinha um grupo de amigos que fazia inveja a qualquer um. O rapaz era um fenómeno. Não havia alma que não quisesse fazer parte do seu círculo de amizades. E assim andava, feliz, sem grandes ondas! Um dia começou a ouvir dizer que havia um novo vizinho no bairro (parece-me que se chamava "blogosfera", o bairro), e que já começava a cair em graça da vizinhança. Chamava-se Facebook e era muito dado, de muito fácil lidação... bom rapaz! Que era trabalhador, que sabia imensas coisas sobre todos os vizinhos e.... fazia questão de contar tudo a toda a gente! Ainda assim, e sabendo o risco que corriam, pouco a pouco, os vizinhos começaram a contar-lhe a sua vidinha toda! Ora, como bom vizinho fofoqueiro que era, o Facebook não escondia nada de ninguém e, às tantas, já toda a vizinhança sabia da vida do vizinho do lado. E até da vida do vizinho que morava na rua mais longínqua! Foi o descalabro! O Facebook era tão popular, tão giro, tão fresco, que toda a minha gente se esqueceu do Blogger, moço educado, comedido, que só contava da vida alheia aquilo que a vida alheia lhe pedia para contar!
Até eu, me esqueci que o Blogger havia sido meu amigo, com tanto frenesim em torno da nova criatura! É verdade... Esqueci-me, inclusive, de todas as vezes em que desabafei, chorei, sorrir e gargalhei, sem ouvir da sua parte uma reprimenda, uma palavra mais brusca... Pelo contrário! Ficava ali, calado, a ouvir, sossegado... E chegámos a ser cerca de 40, lá os da blogosfera do algarve, que nos juntávamos todos, em torno do rapaz, a conversar, a contar histórias, a partilhar experiências...
Fico triste, hoje, ao perceber que a rapidez do Facebook se sobrepôs à calma do Blogger. Até nisto, o fast ganhou ao slow...
Sei que também sou culpada, alto lá que não me estou a ilibar! Mas agora, que a idade já é outra e a vida me foge das mãos a uma velocidade tremenda, decidi voltar à terra, ao mesmo "bairro" que me viu crescer e quero voltar a falar com o blogger! Aliás, aqui está ele! És sempre tão bom ouvinte! Deixa-te ficar assim, não tenhas pressa nem contes ao mundo o que aqui te digo. Fica entre nós. Entre estes, que por aqui ainda andam. Deixa, seremos só nós. Não faz mal. Ao menos, aqui, a vida corre mais devagar.

Quando as adivinhações se concretizam

toda a vida lhe tinham dito: depois dos trinta? Ai, depois dos 30... Cabelos branco, dor nas costas, o joelho que avisa das intempéries, a pele que não brilha, os dentes que apodrecem, as rugas que aparecem.
Sempre pensou serem apenas umas pragas disfarçadas de certezas de quem sabe.
Fossem o que fossem, eram verdade.
Agora, depois dos trinta, decidira fazer o mesmo: espalhar o pânico na mente das jovens carcaças de 22 anos. Aaaaaaaahhhhhhhhh! E sabia bem, saber que - praga ou certeza - aconteceria, depois dos 30.

29.7.13

Sem título III

Trazia na alma a canção da manhã e no olhar a discussão da noite anterior. Tudo se resolvera na cama, como acontece com as pessoas que não amam. Mas amava. E não compreendia a solidão que teimava em manifestar-se.
Bebeu o café no sítio do costume, encontrou o homem lindo que bebia descafeinado às 8h55, esperou pelas 9h00 e largou 50 cêntimos em cima da mesa. Depois da porta do café da esquina era a selva. O barulho ensurdecedor, o cheiro a mortos-vivos, a cor amarela da cidade.
Baixou os óculos escuros até aos olhos, suspirou e fez-se à calçada. Evitou pisar a merda espalhada pelo chão, não tirou as mãos dos bolsos e acabou por chegar ao destino.
a canção da manhã continuava na alma, mas o olhar era agora de quem vampiriza a alma dos outros. Solidão, raiva, embargo na voz e uma tristeza imensa.
Segunda-feira.