28.1.05

Memórias I

Éramos miúdas e inconscientes. Eu tinha 6, a Elsa 11 e a Cecília 13. Foi talvez o único momento das nossas vidas em que brincámos em conjunto. Mais ou menos, os nossos interesses eram semelhantes. Desmontávamos as prateleiras das estantes do quarto onde dormiamos as três. Arrumávamos tudo à nossa maneira. Levávamos horas naquilo. Fazíamos autênticos apart-hoteis para as mais de 10 barriguitas da família. Montávamos elevadores, garagem, cozinha, quartos, sala... Quando estava tudo pronto para começarmos a brincar a minha mãe chamava-nos para almoçar. Depois eram as birras, os choros das mais novas e o desencanto. Raramente chegávamos à parte em que as barriguitas "existiam", numa vida criada por nós.
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Depois comecei a brincar só com a Elsa. A Cecília, irmã mais velha, tinha agora outros interesses. E com a Elsa brincava, sobretudo, com jogos de tabuleiro. O "Jogo da Glória" era o preferido. Mas também jogávamos com o "Bingo", "Monopólio" (que nunca acabava) e, mais tarde, ao "Quem é Quem". Depois vieram os jogos mais sofisticados para a nossa idade. "Uma questão de escrúpulos", "A Bolsa", "Master Mind"... Foi nessa altura que comecei a ficar até mais tarde na rua e a minha irmã Elsa a ficar mais tempo em casa. A minha mãe chamava-a para casa mais cedo. "Pareces a mãe galinha com os filhos pintainhos!", gritava a minha mãe da janela.
E parecia mesmo. Sempre foi grande demais para os seus 12, 13 anos. Ser calmeirona, como o meu pai sempre a designou, trouxe-lhe alguns dissabores. Mas a mim sempre me serviu para os abraços fortes. E acho que ela nunca soube disso. Dizia ela, há uns anos, que ser a irmã do meio era o mais infeliz. Mal ela sabe o quão importante foi na minha vida de criança, adolescente e o quanto continuará a ser, no futuro.

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