Deixou-se ficar a apanhar chuva. De nada valia correr. Ali ficou, imóvel, com os olhos enterrados no chão, curvado, como se pedisse que a terra o engolisse. Lembrou o melhor e o pior da sua vida. Tinha feito de tudo um pouco. Não se arrependia de nada. Ou de quase nada. tinha ficado com uma atravessada na garganta: ter recusado casar com ela, que era hoje uma linda mulher - também só. Agora já pouco lhe restava. Começou a murmurar em voz baixa: valeu a pena. Valeu a pena. Decerto que haviam passado pela sua vida pessoas que tinham aprendido algo consigo. E isso bastava-lhe: saber que tinha deixado cá alguma coisa.
Mantinha os olhos enterrados no chão, como se implorasse que a terra se abrisse de súbito e o engolisse. Mas nada. Teria de ser ele a cavar o abismo para onde queria ir.
A chuva cessou, instalou-se um silêncio total. Era o mundo a permitir-lhe pensar outra vez. Avaliar se, de facto, valeria a pena. Que sim, que valia, que a vida estava vivida. Estava decidido. Olhou para cima, insultou os deuses pela sua insistência. Encheu-se de ódio e de coragem. Meteu os olhos nos chão, implorou que a terra o engolisse e, desta vez, o mundo cedeu à sua vontade.
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